CASTRO ALVES, Antonio
Brinca o luar — dourada borboleta; E as vagas após ele correm… cansam Como turba de infantes inquieta.
Os astros saltam como espumas de ouro… O mar em troca acende as ardentias, — Constelações do liquido tesouro…
Ali se estreitam num abraço insano, Azuis, dourados, placidos, sublimes… Qual dos dous é o céu? qual o oceano?…
Ao quente arfar das virações marinhas, Veleiro brigue corre à flor dos mares, Como roçam na vaga as andorinhas…
Quem sabe o rumo se é tao grande o espaço? Neste saara os corcéis o pó levantam, Galopam, voam, mas nao deixam traço.
Sentir deste painel a majestade! Embaixo — o mar em cima — o firmamento… E no mar e no céu — a imensidade!
Que música suave ao longe soa! Meu Deus! como é sublime um canto ardente Pelas vagas sem fim boiando à toa!
Tostados pelo sol dos quatro mundos! Crianças que a procela acalentara No berço destes pélagos profundos!
Esta selvagem, livre poesia, Orquestra — é o mar, que ruge pela proa, E o vento, que nas cordas assobia…
Por que foges do pavido poeta? Oh! quem me dera acompanhar-te a esteira Que semelha no mar — doudo cometa!
Tu que dormes das nuvens entre as gazas, Sacode as penas, Leviathan do espaço, Albatroz! Albatroz! da-me estas asas.
Donde é filho, qual seu lar? Ama a cadência do verso Que lhe ensina o velho mar! Cantai! que a morte é divina! Resvala o brigue à bolina Como golfinho veloz. Presa ao mastro da mezena Saudosa bandeira acena As vagas que deixa após.
Requebradas de langor, Lembram as moças morenas, As andaluzas em flor! Da Italia o filho indolente Canta Veneza dormente, — Terra de amor e traiçao, Ou do golfo no regaço Relembra os versos de Tasso, Junto às lavas do vulcao?
Que ao nascer no mar se achou, (Porque a Inglaterra é um navio, Que Deus na Mancha ancorou), Rijo entoa patrias glóorias, Lembrando, orgulhoso, históorias De Nelson e de Aboukir.. . O Francês — predestinado — Canta os louros do passado E os loureiros do porvir!
Que a vaga jônia criou, Belos piratas morenos Do mar que Ulisses cortou, Homens que Fidias talhara, Vao cantando em noite clara Versos que Homero gemeu… Nautas de todas as plagas, Vós sabeis achar nas vagas As melodias do céu!…
Desce mais… inda mais… nao pode olhar humano Como o teu mergulhar no brigue voador! Mas que vejo eu ai… Que quadro d’amarguras! É canto funeral!… Que tétricas figuras!… Que cena infame e vil… Meu Deus! Meu Deus! Que horror!
Que das luzernas avermelha o brilho. Em sangue a se banhar. Tinir de ferros… estalar de açoite… Legiões de homens negros como a noite, Horrendos a dançar…
Magras crianças, cujas bocas pretas Rega o sangue das maes: Outras moças, mas nuas e espantadas, No turbilhao de espectros arrastadas, Em ânsia e magoa vas!
E da ronda fantastica a serpente Faz doudas espirais… Se o velho arqueja, se no chao resvala, Ouvem-se gritos… o chicote estala. E voam mais e mais…
A multidao faminta cambaleia, E chora e dança ali! Um de raiva delira, outro enlouquece, Outro, que martirios embrutece, Cantando, geme e ri!
E após fitando o céu que se desdobra, Tão puro sobre o mar, Diz do fumo entre os densos nevoeiros: “Vibrai rijo o chicote, marinheiros! Fazei-os mais dançar!…”
E da ronda fantastica a serpente Faz doudas espirais… Qual um sonho dantesco as sombras voam!… Gritos, ais, maldiçõoes, preces ressoam! E ri-se Satanas!…
Dizei-me vós, Senhor Deus! Se é loucura… se é verdade Tanto horror perante os céus?! O mar, por que nao apagas Co’a esponja de tuas vagas De teu manto este borrao?… Astros! noites! tempestades! Rolai das imensidades! Varrei os mares, tufao!
Que nao encontram em vos Mais que o rir calmo da turba Que excita a fúria do algoz? Quem sao? Se a estrela se cala, Se a vaga à pressa resvala Como um cumplice fugaz, Perante a noite confusa… Dize-o tu, severa Musa, Musa libérrima, audaz!…
Onde a terra esposa a luz. Onde vive em campo aberto A tribo dos homens nus… Sao os guerreiros ousados Que com os tigres mosqueados Combatem na solidao. Ontem simples, fortes, bravos. Hoje miseros escravos, Sem luz, sem ar, sem razao. . .
Como Agar o foi também. Que sedentas, alquebradas, De longe… bem longe vêm… Trazendo com tibios passos, Filhos e algemas nos braços, N’alma — lagrimas e fel… Como Agar sofrendo tanto, Que nem o leite de pranto Têm que dar para Ismael.
Das palmeiras no pais, Nasceram crianças lindas, Viveram moças gentis… Passa um dia a caravana, Quando a virgem na cabana Cisma da noite nos véus… … Adeus, ó choça do monte, … Adeus, palmeiras da fonte!… … Adeus, amores… adeus!…
Depois, o oceano de pó.. Depois no horizonte imenso Desertos… desertos só… E a fome, o cansaço, a sede… Ai! quanto infeliz que cede, E cai p’ra nao mais s’erguer!… Vaga um lugar na cadeia, Mas o chacal sobre a areia Acha um corpo que roer.
A guerra, a caça ao leao, O sono dormido à toa Sob as tendas d’amplidao? Hoje… o porao negro, fundo, Infecto, apertado, imundo, Tendo a peste por jaguar… E o sono sempre cortado Pelo arranco de um finado, E o baque de um corpo ao mar…
A vontade por poder… Hoje… cúum’lo de maldade, Nem sao livres p’ra morrer. . Prende-os a mesma corrente — Férrea, lúgubre serpente — Nas roscas da escravidao. E assim zombando da morte, Dança a lúgubre coorte Ao som do açoute… Irrisao!…
Dizei-me vós, Senhor Deus, Se eu deliro… ou se é verdade Tanto horror perante os céus?!… O mar, por que nao apagas Co’a esponja de tuas vagas Do teu manto este borrao? Astros! noites! tempestades! Rolai das imensidades! Varrei os mares, tufao?…
P’ra cobrir tanta infâmia e cobardia!… E deixa-a transformar-se nessa festa Em manto impuro de bacante fria!… Meu Deus! meu Deus! mas que bandeira é esta, Que impudente na gavea tripudia? Silêncio. Musa… chora, e chora tanto Que o pavilhão se lave no teu pranto!…
Que a brisa do Brasil beija e balança, Estandarte que a luz do sol encerra E as promessas divinas da esperança… Tu que, da liberdade após a guerra, Foste hasteado dos heróis na lança Antes te houvessem roto na batalha, Que servires a um povo de mortalha!…
Extingue nesta hora o brigue imundo O trilho que Colombo abriu nas vagas, Como um iris no pélago profundo! Mas é infâmia demais!… Da etérea plaga Levantai-vos, heróis do Novo Mundo! Andrada! arranca esse pendao dos ares! Colombo! fecha a porta dos teus mares! . . . . .
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The moonlight plays — golden butterfly; And the waves run after it. . . tire Like a band of troubled infants.
The stars leap like spray of gold. . . The sea in turn lights phosphorescence, — Constellations of liquid treasure...
Strain there in a mad embrace Blue, golden, placid, sublime.. Which of the two is ocean? Which sky?...
To the warm breath of the marine breezes, Sailed brig run on the crests of the seas, As the swallows brush in the wave...
Who knows the course if the space is so great? On this Sahara the coursers raise dust, Gallop, soar, but leave no trace.
Feel this panel's magesty!.. . Below — the sea... above — the firmament! ... And in the sea and in the sky — the immensity!
What soft music sounds far off! My God! how sublime an ardent song is Floating at random on the endless waves!
Toasted by the sun of the four worlds! Children whom the tempests warmed In the cradle of these profound abysses!
This savage, free poetry.. . Orchestra — is the sea, which roars by the prow And the wind, which whistles in the ropes.
Why do you flee the fearless poet? Would that I could accompany the furrow You sow in the sea — mad comet!
You who sleep in the gauze of the clouds, Shake your feathers, leviathan of space Albatroz! Albatroz! give me those wings.
Or where he is the son, where his home? He loves the cadence of the verse Which is faught him by the old sea! Sing! Death is divine! The brig slips on the bowline Like a swift dolphin. Fast to the mizzen mast The nostalgic flag points To the waves it leaves behind.
Broken with languor, They recall the dusky maidens The Andalusians in flower! From Italy the indolent son Sings of sleeping Venice, — Land of love and treachery, Or from the gulf in its lap Recalls the verses of Tasso Close to the lava of the volcano.
Who from birth found himself at sea (Because England is a ship, Which God anchored in the Channel), Stern, he intoans his countryls glories Remembering, proudly, histories Of Nelson and of Aboukir. The Frenchman — predestined — Sings of the triumphs of the past And the laurels to come!
Whom Ionian space created, Beautiful dark pirates From the sea that Ulysses cut, Men that Phydias seulped, Are singing in the clear night Verses that Homer moaned... Sailors from all lands, Know how to find in the waves The melodies of the skies!. . .
Descend more... even more.. . human glance cannot Like yours plunge into the flying brig! But what is it I see there... What picture of bitterness It’s funeral song! ... What tetric figures! ... What an infamous vile scene!... My God! my God! What horror!
Great lights redenning its brilliance, Bathing it in blood. Clang of irons. .. snap of whip ... Legions of men black as the night Horrible dancing...
Scrawny infants whose black mouths Are watered by the blood of their mothers: Others, young, but nude and frightened, In the whirlwind of specters drawn From anxiety and vane resentment!
And from the fantastic circle a serpent Spirals madly... If the old man cringes, slips to the ground, You hear shouts... the whip cracks. And they fligh more and more.
The famished multitude shudders, Aud weeps and dances! One is delirious from rabies, another is going mad, Another, bruttish from martyrdom Sings, groans, and laughs!
And after gazing at the sky which unfolds So pure over the sea, Cries out of the gloom of dense obscurity, "Shake out the whip, mariners! Make them dance, more!..."
And from the fantastic circle a serpent Spirals madly... Like a dantesque dream the shadows fly! Shouts, ahs, curses, embodied prayers! And Satan laughs! ...
Tell me Lord God! If if is madness... or truth So much horror under the skies?!... Oh sea why do you not erase With the sponge of the waves, Your mantle, this blot?... Stars! Nights! Tempests! Roll down from the immensity! Sweep the seas, typhoon!
Who do not find in you, More than the calm laughter of the band Which excitcs the torturers to fury? Who are they? If the star hushes, If the oppressive space slides by Like a furtive accomplice, Before the confused night Say it severe Muse Free, audacious Muse! ...
Where the land espouses the light Where in the open spaces lives A tribe of nude men. . . They are daring warriors Who with the, spotted tigers Combat in the solitude. Yesterday simple, strong, brave... Today miserable slaves, Lacking air, light, reason.
Like Agar was also, Who thirsty, weakened, Come from far far off... Bringiiig with tepid steps, Children and irons on their arms, In their souls — tears and gaul. . . Like Agar suffering so much That not even the milk of lament Have they to give Ismael.
From the palms of the country, They were born — beautiful children, They lived — gentle maidens.. . A caravan goes by one day When the virgin in the cabin Apprehensive from the veils of night ... Good-bye mountain hut, ... Good-bye palms of the fountain! ... Good-bye, loves... good-bye!
Afterwards, the ocean of dust. Afterwards, on the immense horizon Deserts... deserts only... And hunger, the tiredness, the thirst... Oh how many unfortunates give up, And fail to rise no more! ... A place in the chain vacates, But the jackal on the sand Finds a body to gnaw.
The war, the chase, the lion, Sleep slept carelessly Under the tents of amplitude! Today the dark, deep hole Infected, cramped, loathsome Having the plague for a jaguar... And sleep always broken By death rattles And the thud of corpses into the sea. . .
Will for power... Today... the peek of malice They are not even free to die... The same chain binds them — Lugubrious iron snake — In the threads of slavery. And so humming of death, The lugubrious cohort dances To the sound of the lash ... Humiliation!. . .
Tell me, Lord God, Am I delirious... or is it truth So much horror under the skies?! ... Oh sea, why don't you crase With the sponge of the waves, Your mantle, this blot? Stars! nights! tempests! Roll down from the immensity Sweep the seas, typhoon!
To cover so much infamy and cowardice!. Transforming it in that feast Into the impure mantle of a cold bacchante! ... My God! my God! but what flag is this, That impudent floats from the truck? Silence, muse... weep, weep so much That the standard may be washed, by your grief! ...
That the breeze of Brazil caresses and unfurls Standard that in the light of the sun encloses Promises of divine hope... You, who in the liberty after war, Were hoisted by heroes on the lance, Rather that you had been torn in battle Than serve a people as a shrowd! ...
Extinguish this hour loathsome brig The furrow that Columbus opened in the waves, Like an iris in the depth of the seas! But this is too much infamy! ... From the ethereal regions Rise, heroes of the New World! Andrada! Rip that pendant from the air! Columbus! Close the portais of your seas!
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